Michela Vanessa Crisostomo Coimbra Martins

HISTÓRIA DAS MULHERES  NO ESPAÇO PENAL FEMININO DE TRÊS LAGOAS: MÚLTIPLOS OLHARES SOBRE A FORMAÇÃO E CULTURA HISTÓRICA

  

A temática do encarceramento está envolta em polêmicas. Sempre no interior do debate sobre a questão penitenciária/ressocialização – que ocasiona, de certa forma, um discurso social negativo e preconceituoso –, põem-se em confronto os céticos ao sistema prisional, ímpio na sua eficácia de restituir socialmente o preso, e os reabilitadores, que acreditam na viabilidade de recuperação do indivíduo em privação de liberdade e na função social do sistema. Desse modo, demanda-se, por conseguinte, conhecer as percepções sobre a reintegração social desde a perspectiva dos diferentes sujeitos envolvidos, observando suas (dis)semelhantes integrações, considerando suas diferentes inserções, concedendo um olhar de múltiplas informações sobre esse contexto e fugindo de visões generalistas.

 

Nesse sentido, esse texto pretende analisar a história das mulheres (compreendendo os processos da infância até sua formação, a cultura e os processos de inserção e trajetórias de vida), na Unidade Prisional Feminina da cidade de Três Lagoas/MS, a qual possui um pavilhões escolar, destinadas às custódiadas condenadas ao cumprimento de penas de reclusão, inicialmente em regime fechado.O objetivo geral da pesquisa é  apresentar um mapeamento sobre as mulheres que egressaram  no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS, a escolarização, infância,  e que forma a educação pauta as mudanças no comportamento dessas reeducandas. 

 

Poucos estudos abordam a temática na área da educação prisional; as pesquisas existentes são no aspecto geral, ou seja, há uma necessidade de pesquisar e compreender os avanços da educação no sistema penitenciário. Pretende-se, com esta pesquisa: 1- Mapear as mulheres sobre custódia, a escolarização, a infância,  de que forma a educação pauta as mudanças no comportamento dessas reeducandas, engressas no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS. Como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96), legislação que regulamenta o sistema educacional; a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) está sendo  executados nesta unidade prisional, pois a garantia de direito à educação é assegurada aos privados de liberdade: a oferta educacional, no Brasil, é assegurada através da Lei de Execução Penal desde o ano de 1988. 2- Considerando que a prisão é o único sistema de confinamento que não passou por reformulações que alterassem a lógica de clausura que se imprime na relação culpa/punição, pretende-se, abordar a vida das mulheres em situação de privação de liberdade na  Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS: Como vivem e se organizam essas mulheres? Qual é a escolarização destas mulheres? Como foi a  infância? Como essas mulheres constroem suas vidas dentro de um sistema que pretende transformá-las? Em outras palavras, a preocupação será entender como, para além da violência inerente e já bem descrita da prisão, vivem essas mulheres.

 

Devido ao nível educacional comumente baixo das pessoas que ingressam no sistema carcerário, há uma limitação da facilidade e aceitação no mercado de trabalho. Os programas educacionais sugerem ser um percurso notável para conceder aos detentos um regresso exitoso à sociedade; deste modo, a educação no sistema penitenciário alvorece a partir da década de 1950. Somente em meados dos anos 1950 surge um interesse em desfazer o insucesso do sistema prisional, aguçando a demanda de sentidos com a educação escolar nas prisões. O direito à educação é, em finalidade, o direito de todos os indivíduos de apoderar-se do conhecimento; por a educação ser primordial no contexto da humanidade, é primordial à vida. Sendo assim, a educação é um direito, pensando nos processo sobre direito humano, como afirma Mello e Souza:

 

pensar em direitos humanos tem um pressuposto: reconhecer que aquilo que consideramos indispensável para nós é também indispensável para o próximo. Essa me parece a essência do problema, inclusive no plano estritamente individual, pois é necessário um grande esforço de educação e autoeducação a fim de reconhecermos sinceramente este postulado. Na verdade, a tendência mais funda é achar que nossos direitos são mais urgentes que os do próximo. (MELLO E SOUZA, 2004, p. 134).

 

Nessa perspectiva, pensar a educação nas prisões requer considerar uma questão apontada por Ireland (2011, p. 11): “[...] qual seria uma educação socialmente relevante para jovens e adultos reclusos?”. Uma parte da sociedade condena qualquer investimento em melhorias no sistema penitenciário, convencida pela ideia de que a aplicação de recursos na melhoria dos presídios é um desperdício do dinheiro público.

 

Busca-se na pesquisa investigar os documentos normativos, legislações que regem o Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS, procuramos evidenciar se os pontos previstos na legislação prisional estão sendo cumpridos e/ou em processo de efetivação das normas legais. As escolas do sistema prisional necessitam de um trabalho pedagógico voltado para a valorização humana, o resgate de valores e a reintegração social.

 

Vale esclarecer que a proposta de um novo tipo de escolarização para o sistema prisional não se enquadra nos objetivos desta pesquisa; como problemáticas fundamentais desta investigação, citamos: um mapeamento das mulheres sobre custódia no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS, precisadamente sobre os pontos referentes a: Qual é a escolarização destas mulheres? Como foi a  infância? Quais  as mudanças no comportamento pautada na educação; Como vivem e se organizam essas mulheres? Como constroem suas vidas dentro de um sistema que pretende transformá-las? As respostas a todos estes questionamentos servirá como base para comentar, ao longo do desenvolvimento deste trabalho, a aplicabilidade da oferta de ensino nas prisões dessa região.

 

Nesta pesquisa exploratória, o referencial teórico baseia-se nas tendências investigativas contemporâneas na área de política educacional, bem como nas observações de Ireland (2011) relacionadas à educação nas prisões. Além disso, estão muito presentes as análises de Hooks (2013), acerca da educação como prática de liberdade, e de Foucault (1977), cuja leitura quanto às origens da prisão, seus meios e fins é tomada como referência para uma compreensão adequada de como vem se constituindo a cultura penal brasileira. Conforme afirma Mantoan (2003, p. 12), “Nosso modelo educacional mostra há algum tempo sinais de esgotamento, é nesse vazio de ideias, que acompanha a crise paradigmática, ao mesmo em que surge o momento oportuno das transformações”.

 

O desenvolvimento deste estudo aborda a necessidade de realizar uma reflexão acerca da situação da mulher inserida no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS, por trás de um infrator que comete um delito existe um histórico de vida e de formação de caráter delinquente. Os debates em torno do acesso à educação como uma alternativa viável na busca pela redução das desigualdades têm apontado os possíveis caminhos que viabilizam a educação no contexto prisional. Além disso, para que a prática pedagógica seja eficaz, é preciso considerar que:“O homem não se faz homem naturalmente; ele não nasce sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar, avaliar, agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é preciso aprender, o que implica o trabalho educativo. Assim, o saber que diretamente interessa à educação é aquele que emerge como resultado do processo de aprendizagem, como resultado do trabalho educativo. Entretanto, para chegar a esse resultado a educação tem que partir, tem que tomar como referência, como matéria-prima de sua atividade, o saber objetivo produzido historicamente” (SAVIANI, 1997. In. Portal Educação, 2013, p. 11-12).

 

Vale salientar que a pesquisa realizada em prisões requer um cuidado ainda maior do ponto de vista metodológico, porque se trata de um campo carregado de pré-noções e de interesses implícitos. O método a ser aplicado para o desenvolvimento deste projeto se consistirá no estudo de caso realizado no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS. O tipo de pesquisa a ser desenvolvida é a pesquisa exploratória, por meio de coleta de dados através de questionários e, posteriormente, da utilização de técnicas estatísticas para tratar essas informações. Na sequência, os resultados da análise serão apresentados com tabelas e gráficos, confrontando-os com o referencial teórico e com as constatações do campo, permitindo assim uma melhor compreensão do objeto investigado.

 

A pesquisa exploratória, da maneira proposta neste projeto, proporcionará maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a constituir hipóteses. Assim, permitirá conhecer melhor as condições ofertadas pela escola prisional  no Estabelecimento Penal Feminino do município de Três Lagoas, no sentido de garantir o direito da egressa no sistema prisional ao ensino; avaliar até que ponto as metas do Plano Nacional de Educação têm sido alcançado; e identificar a relação existente entre falta de escolaridade e a reincidência criminal.

 

Entendemos como objeto deste trabalho apresentar um mapeamento sobre as mulheres que egressaram  no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS, a escolarização, infância,  e que forma a educação pauta as mudanças no comportamento dessas reeducandas. 

 

Os sujeitos da pesquisa incluem todas as pessoas diretamente envolvidas no Estabelecimento Penal Feminino de Três Lagoas- MS,  dentre as quais podemos citar os professores, pedagogos, coordenadores, assistente social, psicologo, agente penitenciário e, claro, os próprios apenados. Dessa maneira, e de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 196/1996, a pesquisa, por envolver seres humanos, deverá ser submetida à apreciação de um Comitê de Ética em Pesquisa.

 

Referência Bibliográficas

 

Michela Vanessa Crisostomo Coimbra Martins, estudante do Programa de Pós-graduação em Educação- Mestrado- Três Lagoas

 

Orientadora: Jaqueline Aparecida Martins Zarbato, Doutora, Professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

 

Referências bibliográficas

 

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htmAcesso em: 20 jan. 2021.

 

BRASIL. Lei 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htmAcesso em: 20 jan. 2021.

 

BRASIL. Lei 12.433. Altera a Lei 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011- 2014/2011/lei/l12433.htmAcesso em: 20 jan. 2021.

 

CUNHA, E. L. Ressocialização: o desafio da educação no sistema prisional feminino. Cad. Cedes, Campinas, v. 30, n. 81, p. 157-78, maio-ago. 2010.

 

FOUCAULT, M. Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 1977.

 

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 28. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

 

JULIÃO, E. F. As políticas de educação para o sistema penitenciário – análise de uma experiência brasileira. In: ONOFRE, E. M. C. (Org.). Educação escolar entre grades. São Carlos: EduFSCar, 2007. p. 29-50.

 

HOOKS, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. Trad. Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2013.

 

IRELAND, T. D. Educação em prisões no Brasil: direito, contradições e desafios. Em Aberto, Brasília, v. 24, n. 86, p. 19-39, nov. 2011.

 

ONOFRE, E. M. C. Escola da prisão: espaço de construção da identidade do homem aprisionado? In: ONOFRE, E. M. C. (Org.). Educação escolar entre grades. São Carlos: EdUFSCar, 2007. p. 11-28.

 

ONOFRE, E. M. C. Educação escolar de adultos em privação de liberdade: limites e possibilidades. 31ª Reunião, ANPED, 2008.

 

MATO GROSSO DO SUL. SECRETARIA DE EDUCAÇÃO. Resolução/SED nº 3.122, de 7 de novembro de 2016. Aprova o Projeto Pedagógico EJA “Conectando Saberes”. 2016b. Disponível em: http://www.sed.ms.gov.br/wp-content/uploads/2019/06/PROGRAMAS-E- PROJETOS-2019.pdfAcesso em: 20 jan. 2021.

 

MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São Paulo: Moderna, 2003. (Coleção cotidiano escolar).

 

MELLO E SOUZA, A. C. O direito à literatura. In: CARVALHO, J. S. (Org.). Educação, cidadania e direitos humanos. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 130-58.

 

SAVIANI, Dermeval. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 1997,  p. 11-12. In. Portal Educação. “O conceito de educação e a formação do sujeito crítico”. 21 de abr. de 2021.  Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/pedagogia/artigos/42975/oconceito-de-educacao-e-a-formacao-do-sujeito-critico>. Acesso em: 10. Abr. 2015.

 

2 comentários:

  1. Olá Michela! Tudo bem?
    O seu trabalho é muito interessante e muito bem desenvolvido, um assunto pouco trabalhado.
    Eu penso que é extremamente importante pensarmos na educação destas mulheres, pois a educação altera as pessoas e para um lado positivo, então com certeza dentro dos presídios femininos ela é transformadora e indispensável.
    Mais uma vez, parabéns pelo seu texto.

    Milena Silvério Ferreira

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  2. Michela, parabéns pelo seu trabalho. abraços

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